PEDIDO DE DEMISSÃO CONSIGNADO NO TRCT HOMOLOGADO PODE SER CONVERTIDO EM RESCISÃO INDIRETA?

“(…) RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO ACÓRDÃO PUBLICADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. TRCT. HOMOLOGAÇÃO COM ASSISTÊNCIA SINDICAL. EXPRESSO PEDIDO DE DEMISSÃO, SEM RESSALVA NO REFERIDO TERMO. AÇÃO TRABALHISTA PROPONDO A CONVERSÃO EM RESCISÃO INDIRETA, EM FACE DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO ORIUNDO DE ABALO PSICOLÓGICO POR ASSÉDIO MORAL, QUANDO DO PEDIDO DE DEMISSÃO.

A presente discussão diz respeito à homologação do TRCT com assistência sindical e seus efeitos quanto ao pedido de demissão e posterior ajuizamento de reclamação trabalhista pleiteado a rescisão indireta do contrato de trabalho, em face de vício de consentimento (abalo psicológico em face de assédio moral). Para melhor compreensão da controvérsia, convém que se proceda um breve relato da presente lide. A sentença, a despeito da homologação do TRCT no respectivo sindicato dos bancários com expresso registro de que a rescisão contratual ocorreu por pedido de demissão, sem qualquer ressalva nesse sentido, reconheceu a rescisão indireta do reclamante sob os seguintes fundamentos: “Diante do que foi levantado nos autos, a reclamante pediu demissão em decorrência do assédio moral que vindo sendo submetida. Ressalto que consta no laudo pericial e nos documentos juntados que: “no último atendimento, realizado pela CASSI, em 13.03.2009. a Dra. Solange Viegas Fuscaidi – Psicóloga – registrou que ‘ a paciente refere melhora em estado emocional. Ainda teme retomar ao trabalho”, portanto, não estava apta para retornar ao trabalho. O que a levou a solicitar licença por interesse e em seguida demissão”. O cenário dos autos noticia, portanto, o cometimento de falta grave por parte da reclamada. Dessa forma, reverto o “pedido de demissão” em despedida sem justa causa, com a condenação da reclamada ao pagamento de: (…)” (destacamos). O e. TRT deu provimento ao recurso ordinário da reclamada para, reformando a r. sentença, decidir que a extinção do contrato de emprego deu-se por iniciativa da reclamante, com o pedido de demissão, devendo serem excluídas da condenação todas as parcelas cujo pedido foi acolhido em função da denominada “rescisão indireta”, ao fundamento de que não houve ressalva no TRCT do reclamante no tocante ao pedido de demissão. Não examinado, portanto, diante dos efeitos da quitação da TRCT com assistência sindical, a ocorrência ou não de vício de consentimento quando do pedido de demissão e sua respectiva conversão em rescisão indireta do contrato de trabalho. Dito isso, nos termos da Súmula n.º 330 do TST, a quitação passada pelo empregado, com assistência de entidade sindical de sua categoria, com observância dos requisitos exigidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, tem eficácia liberatória apenas em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo, dentro do limite dos valores efetivamente pagos, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado às parcelas impugnadas. O artigo 477, § 2.º da CLT é assim dispõe: “§ 2º – O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas”. (grifo nosso). Significa dizer que eventual eficácia liberatória do termo de quitação assinado pelo empregado, a teor da Súmula nº 330 do TST e do art. 447, § 2.º, da CLT, não impede eventual pleito de conversão do pedido de demissão em rescisão indireta do contrato de trabalho com apoio em vício de consentimento decorrente de assédio moral (abalo psicológico). Isso porque o artigo 477 da CLT e a Súmula n.º 330 do TST explicitam que eventual quitação é relativa a uma dada parcela paga ao empregado e não quitação acerca da discussão de eventual modalidade de rescisão do contrato de trabalho, não havendo, portanto, sequer a necessidade de opor ressalva nesse sentido no TRCT quanto essa discussão de conversão da modalidade de rescisão do contrato de trabalho. Recurso de revista conhecido e provido”.

(RR-1846-64.2012.5.08.0008, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 11/09/2020, destaquei).

A discussão estabelecida nesse caso concreto é a seguinte: afigura-se possível discutir a modalidade de extinção do contrato de trabalho que é consignada no TRCT homologado pelo sindicato profissional?

Na ação ajuizada, a empregada alega ter sofrido perseguição e assédio moral por parte do seu superior hierárquico, com consequências negativas para o seu estado de saúde, o que a levou a pedir demissão. Formula vários pedidos relacionados a esse quadro fático, sendo um deles a declaração da rescisão indireta do seu contrato de trabalho e a condenação do empregador-reclamado ao pagamento das verbas rescisórias daí advindas.

Na sentença, a pretensão foi acolhida, por se concluir que o pedido de demissão teve, como causa direta, o assédio moral alegado.

Mas essa decisão foi reformada pelo TRT da 8ª Região, sob o fundamento de que, pela disposição do § 1º do artigo 477 da CLT e pelo entendimento sedimentado na Súmula nº 330 do TST, não seria mais possível discutir a modalidade da rescisão contratual que constou do TRCT homologado pelo sindicato de classe.

Vamos a eles:

Art. 477. ……….
§ 1º – O pedido de demissão ou recibo de quitação de rescisão, do contrato de trabalho, firmado por empregado com mais de 1 (um) ano de serviço, só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato ou perante a autoridade do Ministério do Trabalho e Previdência Social.
(destaquei)

Esse dispositivo, já revogado pela Lei nº 13.467/2017, ainda se encontrava em vigor à época da extinção do contrato de trabalho e previa, justamente, a validade do pedido de demissão pelo empregado, quando feito com a assistência do sindicato que representa a sua categoria profissional (condição essa prevista para os contratos vigentes por período superior a um ano).

Agora, a Súmula nº 330, com redação vigente desde 18/04/2001:

Quitação. Validade
A quitação passada pelo empregado, com assistência de entidade sindical de sua categoria, ao empregador, com observância dos requisitos exigidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, tem eficácia liberatória em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado à parcela ou parcelas impugnadas.
I – A quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, conseqüentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que estas constem desse recibo.
II- Quanto a direitos que deveriam ter sido satisfeitos durante a vigência do contrato de trabalho, a quitação é válida em relação ao período expressamente consignado no recibo de quitação.
(destaquei)

Aplicando esse entendimento ao caso concreto, o TRT da 8ª Região concluiu que, constando do TRCT a rescisão contratual “a pedido”, com homologação pelo sindicato de classe e sem qualquer ressalva quanto a isso, a manifestação é válida, tendo eficácia para todos os efeitos legais. O acórdão regional, inclusive, chega a mencionar a preocupação da legislação e da jurisprudência com eventuais vícios de consentimento, capazes de macular o pedido de demissão do empregado; e que, justamente, por isso, é exigida a assistência sindical, a qual acaba ratificando a manifestação de vontade do empregado.

Finalmente, em sede de recurso de revista, o TST decidiu acolher a irresignação da parte reclamante, sob o fundamento de que a “eficácia liberatória” de que trata a Súmula nº 330 do TST se restringe “às parcelas expressamente consignadas no recibo”, bem como aos seus respectivos valores, não resultando em óbice à discussão judicial quanto à validade da modalidade de extinção contratual ali consignada.

Frisou, inclusive, a restrição imposta pelo § 2º do artigo 477 da CLT à quitação dada pelo TRCT:

“§ 2º – O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas.”
(destaquei)

Com isso, constatando que o TRT da 8ª Região não havia examinado a questão à luz da possível existência de vício de consentimento decorrente de assédio moral, concluiu ter havido violação ao princípio do amplo acesso à justiça (artigo 5º, inciso XXXV, da CF), determinando o retorno dos autos ao Regional, para prosseguimento do exame do recurso ordinário interposto pela reclamante quanto a esse aspecto.

Em suma, a questão afeta ao direito objetivo está decidida: ainda que conste do TRCT homologado pelo sindicato, sem qualquer ressalva, a extinção do pacto como tendo sido “a pedido”, o empregado pode pleitear, em ação trabalhista, a sua conversão em dispensa motivada por falta grave do empregador (rescisão indireta).

O que ainda não ficou decidido no caso concreto é se, realmente, houve vício de consentimento quanto ao pedido de demissão feito pela parte reclamante. E isso demanda a análise de fatos e provas pelo TRT.

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