NÃO SE ADMITE A HOMOLOGAÇÃO APENAS PARCIAL DO ACORDO EXTRAJUDICIAL

“RECURSO DE REVISTA – ACORDO EXTRAJUDICIAL HOMOLOGADO EM JUÍZO – PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA – ARTS. 855-B A 855-E DA CLT – QUITAÇÃO GERAL – TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA.

1. Problema que sempre atormentou o empregador foi o relativo à rescisão do contrato de trabalho e da quitação dos haveres trabalhistas, de modo a não permanecer com a espada de Dâmocles sobre sua cabeça.

2. A ineficácia prática da homologação da rescisão contratual do sindicato, em face do teor da Súmula 330 do TST, dada a não quitação integral do contrato de trabalho, levou a SBDI-2 desta Corte a não reputar simulada a lide visando à homologação de acordo pela Justiça do Trabalho, pois só assim se conseguiria colocar fim ao conflito laboral e dar segurança jurídica às partes do distrato (cfr. TST-ROAR-103900-90.2005.5.04.0000, Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, DEJT de 12/09/08).

3. Para resolver tal problema, a Lei 13.467/17, em vigor desde 11/11/17, instituiu o procedimento de jurisdição voluntária na Justiça do Trabalho atinente à homologação, em juízo, de acordo extrajudicial, nos termos dos arts. 855-B a 855-E da CLT, juntamente com o fito de colocar termo ao contrato de trabalho.

4. Da simples leitura dos novos comandos de lei, notadamente do art. 855-C da CLT, extrai-se a vocação prioritária dos acordos extrajudiciais para regular a rescisão contratual e, portanto, o fim da relação contratual de trabalho. Não fosse a possibilidade da quitação do contrato de trabalho com a chancela do Judiciário e o Capítulo III-A não teria sido acrescido ao Título X da CLT, que trata do Processo Judiciário do Trabalho.

5. Curial, ainda, trazer à baila, que a ideia que indelevelmente adere ao acordo extrajudicial é a de que, retirada uma das cláusulas que o compõem, a parte a quem ela favoreceria não faria o acordo. A alternativa que caberia ao Judiciário, portanto, seria a homologação integral ou a rejeição da proposta, se eivada de vícios. Tal entendimento resta corroborado pelo STF quanto à circunstância de a validade do acordo depender da homologação integral ou de sua rejeição total, não podendo ser balanceado pelo Poder Judiciário (Voto do Min. Teori Zavascki no leading case STF-RE 590.715/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe de 29/05/15).

6. Nesse sentido, o art. 855-B, §§ 1º e 2º, da CLT, que trata da apresentação do acordo extrajudicial à Justiça, a par dos requisitos gerais de validade dos negócios jurídicos que se aplicam ao direito do trabalho, nos termos do art. 8º, § 1º, da Lei Consolidada e que perfazem o ato jurídico perfeito (CC, art. 104 – agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não vedada por lei), traçou as balizas para a apresentação do acordo extrajudicial apto à homologação judicial: petição conjunta dos interessados e advogados distintos, podendo haver assistência sindical para o trabalhador.

7. A petição conjuntamente assinada para a apresentação do requerimento de homologação ao juiz de piso serve à demonstração da anuência mútua dos interessados em por fim ao contratado, e, os advogados distintos, à garantia de que as pretensões estarão sendo individualmente respeitadas. Assim, a atuação do Judiciário Laboral na tarefa de jurisdição voluntária é binária: homologar, ou não, o acordo. Não lhe é dado substituir-se às partes e homologar parcialmente o acordo, se este tinha por finalidade quitar integralmente o contrato de trabalho extinto. Em quitação geral, o Empregador não proporia o acordo, nem se disporia a manter todas as vantagens nele contidas.

8. No caso concreto, o Regional, mantendo a sentença, assentou a ausência de discriminação das parcelas às quais os Acordantes conferiam quitação geral e irrestrita, restringindo a quitação a direitos mencionados no acordo e registrando, todavia, o cumprimento dos requisitos do art. 855-B da CLT e daqueles gerais estatuídos pela lei civil para a celebração de negócios em geral.

9. Nesse sentido, a conclusão acerca da invalidade, total ou parcial, do pacto extrajudicial, por ausência de verificação de concessões mútuas e discriminação de parcelas diz menos com a validação extrínseca do negócio jurídico do que com a razoabilidade intrínseca do acordo, cujo questionamento não cabe ao Judiciário nesse procedimento, pois lhe esvazia o sentido e estabelece limites e discussões não queridos pelos Requerentes ao ajuizar o procedimento.

10. Ora, estando presentes os requisitos gerais do negócio jurídico e os específicos preconizados pela lei trabalhista (CLT, art. 855-B), não há de se questionar a vontade das partes envolvidas e do mérito do acordado, notadamente quando a lei requer a presença de advogado para o empregado, rechaçando, nesta situação, o uso do jus postulandi do art. 791 da CLT, como se depreende do art. 855-B, § 1º, da CLT.

11. Assim sendo, é válido o termo de transação extrajudicial apresentado pelos Interessados, com quitação geral e irrestrita do contrato havido, nessas condições, que deve ser homologado. Recurso de revista provido”

(RR-919-15.2018.5.09.0088, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra Martins Filho, DEJT 04/09/2020, destaquei).

Diante da ementa desse julgado, o caso até dispensa maiores comentários.

Apenas para contextualizar, consigno que os artigos 855-B a 855-E, introduzidos na CLT pela Lei nº 13.467/2017, surgem após anos de preocupação dos juízes do trabalho com as chamadas lides simuladas.

O fato é que, antes de instituída a denominada reforma trabalhista, era em vão qualquer tentativa de ajuste extrajudicial que o empregador fizesse com o empregado para fins de quitação da relação de emprego havida. Nem mesmo com a assistência da entidade sindical isso era possível (Súmula nº 330 do TST).

Sobrava, então, a possibilidade de se firmar acordo nos próprios autos da ação trabalhista, muitas vezes ajuizada de maneira fraudulenta.

É claro que essa preocupação não iria desaparecer de uma hora para outra. Ela persiste até os dias atuais e também é trazida para a análise dos pedidos de homologação de acordo extrajudicial: muitos juízes e tribunais, resistindo à ideia de chancelar a cláusula do ajuste que trata da quitação ampla e irrestrita do contrato de trabalho, decidem por acolher o pedido apenas parcialmente. E é justamente contra isso que têm se insurgido os empregadores nas instâncias superiores.

A decisão da 4ª da Turma do Tribunal Superior do Trabalho, acima transcrita, revela uma tendência em sentido contrário. O entendimento é no sentido de que, sendo feito em sede de jurisdição voluntária, o pedido de homologação de acordo extrajudicial não é passível de decisão “intermediária”: ou ele é totalmente acolhido, ou é inteiramente rejeitado.

Portanto, para o TST, não existe muito espaço para o juízo de conveniência ou oportunidade a ser exercido pelos juízes e tribunais nesses processos (parágrafo único do artigo 723 do CPC), sob pena de se frustrar as expectativas das partes acordantes, notadamente do empregador, o qual, possivelmente, não teria concordado com o ajuste, se não fosse para lhe atribuir o efeito de quitação do vínculo de emprego.

Noutro dizer, de acordo com o entendimento do TST, o acolhimento apenas parcial do pedido de homologação do acordo extrajudicial, afastando a cláusula de quitação ampla e irrestrita do contrato de trabalho, altera o contexto em que firmado o ajuste, impondo uma condição desvantajosa para o ex-empregador, o que, certamente, não contribui para o equilíbrio do ato conciliatório e para a segurança jurídica que se espera do Poder Judiciário.

Portanto, o que se espera das partes, aqui, é a observância dos pressupostos legais para a formulação do pedido de homologação de acordo extrajudicial, quais sejam:

  1. requisitos gerais de validade do negócio jurídico (agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não vedada por lei – artigo 104 do Código Civil) – ausência de vícios de consentimento, pois;
  2. petição conjunta dos requerentes; e
  3. representação dos requerentes por advogados distintos, não se admitindo o “jus postulandi”.

Além disso, duas observações devem ser feitas aqui:

  1. O pedido de homologação de acordo extrajudicial não afasta o dever do empregador quanto ao prazo previsto para o cumprimento das obrigações rescisórias (§ 6º do artigo 477 da CLT): uma vez descumprido, incide, do mesmo jeito, a multa de que trata o § 8º (artigo 855-C da CLT).
  2. O pedido de homologação de acordo extrajudicial não interrompe o prazo prescricional da ação: ao contrário do que dispõe o § 3º do artigo 11 da CLT, há, sim, mera suspensão desse prazo, o qual volta a fluir no dia útil seguinte ao do trânsito em julgado da decisão que rejeita a homologação (artigo 855-E da CLT).

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