“RECURSO ORDINÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AÇÃO RESCISÓRIA AJUIZADA SOB A ÉGIDE DO CPC DE 2015. TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO RESCINDENDA OCORRIDO NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. CAUSA DE RESCINDIBILIDADE APRECIADA NO ENFOQUE DO CPC/1973. PEDIDO DE DESCONSTITUIÇÃO FUNDADO NO ART. 966, V, DO CPC/2015. CORRESPONDÊNCIA COM O ART. 485, V, DO CPC/1973.

Conforme o entendimento firmado por esta Subseção, ocorrendo o trânsito em julgado da decisão rescindenda na vigência do CPC/1973, como no caso dos autos, as causas de rescisão, bem como os pressupostos de constituição e validade regular do processo, continuam por ele regidos. Assim, tendo o autor indicado o art. 966, V, do CPC/2015 como causa de rescindibilidade e, havendo a sua correspondência com o art. 485, V, do CPC/1973, deve ser regularmente apreciado o pleito rescisório.

INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. RECOLHIMENTO DO DEPÓSITO PRÉVIO EM GUIA INADEQUADA. GRU. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. PROVIMENTO. PRECEDENTES.

O depósito prévio foi recolhido pelo recorrente em Guia de Recolhimento da União – GRU, em descompasso com o procedimento estabelecido no art. 1.º da Instrução Normativa n.º 31 desta Corte, que prevê a utilização da guia de depósito judicial para essa finalidade. É dizer, a forma do ato não foi observada escorreitamente pelo autor. Nada obstante, é preciso ver que sua finalidade foi atingida, pois o depósito prévio está à disposição do Juízo, devidamente identificado e vinculado ao processo matriz, consoante informado na guia de recolhimento. Nessa perspectiva, impende salientar que a disciplina dos atos processuais é informada pelo princípio da instrumentalidade das formas, que, prestigiando a compreensão de que o processo é instrumento de realização do Direito e não um fim em si mesmo, confere validade plena aos atos que, embora realizados de forma diversa daquela preconizada pela lei, atingem sua finalidade essencial, princípio albergado nos arts. 154 e 244 do CPC de 1973. Consequentemente, a constatação de que o depósito prévio realizado por meio da GRU atingiu sua finalidade é suficiente para fazer reputar atendido o pressuposto processual de admissibilidade tratado pelos arts. 836 da CLT e 488, II, do CPC/1973. Recurso Ordinário conhecido e provido”

(RO-6016-69.2016.5.15.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 18/09/2020, destaquei).

O caso concreto trata do depósito prévio exigido para o ajuizamento da ação rescisória. Assim dispõe o artigo 836, “caput”, da CLT, com redação dada pela Lei nº 11.495/2007:

Art. 836. É vedado aos órgãos da Justiça do Trabalho conhecer de questões já decididas, excetuados os casos expressamente previstos neste Título e a ação rescisória, que será admitida na forma do disposto no Capítulo IV do Título IX da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, sujeita ao depósito prévio de 20% (vinte por cento) do valor da causa, salvo prova de miserabilidade jurídica do autor.

(destaquei)

Esse valor previsto para a ação rescisória ajuizada na Justiça do Trabalho é quatro vezes superior àquele exigido pelo artigo 968, inciso II, do CPC (5% sobre o valor da causa); e a forma da sua realização está regulamentada na Instrução Normativa nº 31/2007 do TST, cujo artigo 1º dispõe o seguinte:

Art. 1° O depósito prévio em ação rescisória de que trata o art. 836 da CLT, com redação dada pela Lei n° 11.495, de 22 de junho de 2007, deverá ser realizado em conta vinculada ao juízo, observando-se as seguintes peculiaridades quanto ao preenchimento da guia de depósito judicial:

I – nos campos relativos à identificação do processo deverão ser informados os dados do processo em que foi proferida a decisão rescindenda;


II – o campo “Tipo de Depósito” deverá ser preenchido com o número 1 (primeiro depósito), ainda que outros depósitos judiciais tenham sido efetuados no processo originário;


III – o campo “Motivo do Depósito” deverá ser preenchido com o número 4 (Outros).


(destaquei)

Portanto, a rigor, o depósito prévio exigido para o ajuizamento da ação rescisória deve ser realizado por intermédio de guia de depósito judicial, cujo acolhimento e levantamento, inclusive, é regulamentado pela Instrução Normativa nº 136/2012 do TST.

No caso concreto, o autor da ação rescisória comprovou a realização do depósito prévio mediante Guia de Recolhimento da União (GRU), o que levou ao indeferimento liminar da petição inicial e, em seguida, ao desprovimento do agravo interno pelo TRT da 15ª Região, por ausência de pressuposto processual específico para o exame da referida ação.

O indeferimento da petição inicial por ausência do depósito prévio correspondente está, expressamente, previsto no § 3º do artigo 968 do CPC, “in verbis”:

“§ 3º Além dos casos previstos no art. 330, a petição inicial será indeferida quando não efetuado o depósito exigido pelo inciso II do caput deste artigo.”

(destaquei)

Portanto, segundo a decisão do TRT da 15ª Região, o depósito prévio por guia inadequada (guia GRU) equivaleria à sua ausência – entendimento esse que foi revisto pelo Tribunal Superior do Trabalho.

Para o TST, ainda que não respeitada a forma prevista em lei, o depósito prévio deve ser validado se atender à sua finalidade essencial, à luz do princípio da instrumentalidade das formas, consubstanciado nos artigos 188 e 277 do CPC, a saber:

Art. 188. Os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial.

Art. 277. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.

(destaquei)

Na hipótese retratada pela ementa transcrita no início desta publicação, ficou constatado que o depósito realizado pelo autor da ação rescisória, embora efetuado pela guia GRU (e não pela guia de depósito judicial), encontrava-se à disposição do juízo e tinha a identificação do processo matriz, estando vinculado a ele – ou seja, os elementos previstos no artigo 1º, inciso I, da Instrução Normativa nº 31/2007 do TST, estavam presentes.

Nesse contexto, foi dado provimento ao recurso, afastando-se o indeferimento da petição inicial.

Convém salientar que os princípios da instrumentalidade das formas e do aproveitamento dos atos processuais têm sido utilizados, pelo TST, como fundamento para o acolhimento de preparos com comprovação “deficiente” nos autos. Além desse julgado em análise, já vimos, aqui, em outra publicação (https://bit.ly/2Kd0X9d), a existência de decisão que reconheceu válido o recolhimento das custas processuais evidenciado apenas pelo comprovante de pagamento – ou seja, sem a juntada da respectiva GRU –, por ser possível constatar, no referido documento, a presença dos elementos previstos no § 1º do artigo 789 da CLT.

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