A APRESENTAÇÃO DE PEDIDO LÍQUIDO LIMITA A CONDENAÇÃO?

“RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. APELO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA.

A controvérsia gira acerca da aplicação do artigo 840, § 1º, da CLT, que foi alterado pela Lei 13.467/2017. No caso em tela, o debate acerca do art. 840, § 1º, da CLT, detém transcendência jurídica, nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT. A controvérsia acerca da limitação da condenação, aos valores liquidados apresentados em cada pedido da inicial, tem sido analisado, pela jurisprudência dominante, apenas sob a égide dos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil. Por certo que aludidos dispositivos do CPC são aplicados subsidiariamente no processo trabalhista. Entretanto, no que se refere à discussão acerca dos efeitos dos pedidos liquidados, apresentados na inicial trabalhista, os dispositivos mencionados do CPC devem ceder espaço à aplicação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 840 da CLT, que foram alterados pela Lei 13.467/2017. Cumpre esclarecer que o TST, por meio da Resolução nº 221, de 21/06/2018, considerando a vigência da Lei 13.467/2017 e a imperativa necessidade de o TST posicionar-se, ainda que de forma não exaustiva, sobre a aplicação das normas processuais contidas na CLT alteradas ou acrescentadas pela Lei 13.467/2017, e considerando a necessidade de dar ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que no seu art. 12, § 2º, normatizou que “para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado (…)”. A Instrução Normativa nº 41/2018 do TST, aprovada mediante Resolução nº 221, em 02/06/2018, registra que a aplicação das normas processuais previstas na CLT, alteradas pela Lei 13.467/2017, com eficácia a partir de 11/11/2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidas sob a égide da lei revogada. Portanto, no caso em tela, em que a inicial foi ajuizada no ano 2018, hão de incidir as normas processuais previstas na CLT alteradas pela Lei 13.467/2017. Assim, a discussão quanto à limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial deve ser considerada apenas como fim estimado, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta Corte. A decisão regional que limitou a condenação aos valores atribuídos aos pedidos na inicial configura ofensa ao art. 840, § 1º, da CLT. Reconhecida a transcendência jurídica do recurso de revista. Recurso de revista conhecido e provido”

(ARR-1000987-73.2018.5.02.0271, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 16/10/2020, destaquei).

Nesse caso concreto, a discussão estabelecida em sede de recurso de revista envolve a aplicação do princípio da congruência, também chamado de princípio da adstrição, o qual determina a atuação do juiz nos limites propostos pelas próprias partes no processo.

No Código de Processo Civil de 1973, esse princípio estava consubstanciado nos artigos 128 e 460, posteriormente substituídos, no CPC/2015, pelos artigos 141 e 492, respectivamente:

Art. 141. O juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.

Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.

(destaquei)

Com base em tais preceitos legais é o que Tribunal Superior do Trabalho já tinha firmado entendimento, no sentido de que a condenação imposta à parte reclamada deve ficar limitada aos parâmetros fixados pelo próprio reclamante na petição inicial, notadamente quando os pedidos são acompanhados de valores líquidos, sem qualquer ressalva.

Por oportuno, cito este aresto da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST:

“RECURSO DE EMBARGOS. REGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. JULGAMENTO “ULTRA PETITA”. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO VALOR ATRIBUÍDO AO PEDIDO NA PETIÇÃO INICIAL.
1. A Quarta Turma considerou que o requerimento, na petição inicial, de “pagamento de 432 horas ‘in itinere’ no valor de R$ 3.802,00 (fl. 11 – numeração eletrônica) “traduziu” mera estimativa, tendo o magistrado feito a adequação de acordo com as provas do processo”, razão pela qual não reputou violados os arts. 141 e 492 do CPC.
2. Todavia, esta Corte Superior adota firme entendimento no sentido de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Precedentes. Recurso de embargos conhecido e provido”.
(E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa, DEJT 29/05/2020, destaquei)

Perceba que o julgado se deu em ação trabalhista ajuizada antes do advento da Lei nº 13.467/2017, quando o § 1º do artigo 840 da CLT indicava o “pedido” como um dos requisitos da petição inicial, mas sem exigir a indicação do seu valor.

Essa exigência passou a constar da nova redação daquele dispositivo legal, trazida pela “reforma trabalhista”, a saber:

Art. 840. ……….
§ 1o  Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.
(destaquei)

Com a obrigação de terem que indicar o valor de cada pedido formulado na petição inicial, sob pena de ser extinto sem exame do mérito inclusive (§ 3º do mesmo artigo 840), os reclamantes passaram a cumpri-la; e, com isso, ressurgiu a discussão: esse valor limita, ou não, a condenação eventualmente imposta à parte reclamada?

O próprio TST, pela sua 3ª Turma, já havia decidido em sentido afirmativo, com base nos mesmos dispositivos do CPC e da CLT já transcritos acima e considerando, inclusive, o fato de a parte reclamante não mencionar, na petição inicial, que os valores indicados se destinavam apenas à definição do rito procedimental (fundamento que consta do voto do Ministro Relator).

Esta é a ementa do julgado:

“RECURSO DE REVISTA. VALOR DA CONDENAÇÃO. LIMITAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS. CLT, ART. 840, § 1º. CPC, ARTS. 141 E 492.
1. Tratando-se de ação ajuizada após a entrada em vigor, em 11.11.2017, da Lei nº 13.467/2017, aplicam-se as diretrizes do art. 840, § 1º, da CLT (art. 12 da Instrução Normativa TST nº 41/2018).
2. Conforme preceitua o dispositivo celetista em questão, “sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante”.
3. Restando clara a existência de pedidos líquidos e certos na petição inicial, deve ser limitado o montante da condenação aos valores ali especificados (arts. 141 e 492 do CPC e 840, § 1º, da CLT). Recurso de revista não conhecido”.
(RR-366-07.2018.5.12.0048, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 22/11/2019, destaquei)

Agora, a 6ª Turma do TST decide em sentido contrário, manifestando o entendimento de que o valor do pedido não limita a condenação atribuída ao reclamado. Para tanto, vale-se dos seguintes fundamentos:

  1. a ação trabalhista foi proposta quando já em vigor a Lei nº 13.467/2017, de modo que a controvérsia não deve ser analisada apenas à luz dos artigos 141 e 492 do CPC;
  2. embora aplicados, subsidiariamente, na seara laboral, esses dispositivos devem ceder lugar à aplicação dos §§ 1º e 2º do artigo 840 da CLT, no que diz respeito aos efeitos dos “pedidos liquidados”; e
  3. por meio da Instrução Normativa nº 41/2018, editada com intuito de padronizar a aplicação das normas processuais da CLT alteradas pela Lei nº 13.467/2017, o TST fixou a premissa de que os valores atribuídos aos pedidos formulados na petição inicial se constituem em mera estimativa, não servindo, pois, de limites à condenação.

Em suma, com relação às ações distribuídas após a “reforma trabalhista”, o debate continua, cabendo a você, advogado ou advogada, como eu já sugeri, aqui, em outra publicação (https://bit.ly/2TdJfU1):

  1. ser cauteloso(a) com a indicação do valor do pedido: ele pode não só limitar a condenação (se muito reduzido), como também impor uma sucumbência ao reclamante (se muito elevado); e
  2. deixar bem claro, na petição inicial, que a indicação do valor do pedido é feita por mera estimativa.

Deixe um comentário

[vc_row content_placement="middle" scheme="dark" row_type="normal" row_delimiter="" row_fixed="" hide_on_tablet="" hide_on_mobile="" hide_on_frontpage="" css=".vc_custom_1496914894286{background-color: #23282c !important;}"][vc_column icons_position="left"][trx_sc_content size="1_1" number_position="br" title_style="default" padding="none"][vc_empty_space alter_height="medium" hide_on_mobile="" css=".vc_custom_1497434392904{margin-top: -0.25rem !important;}"][vc_row_inner equal_height="yes" content_placement="middle"][vc_column_inner width="1/2" icons_position="left"][trx_widget_contacts columns="" googlemap="" socials="" logo="1165"][/trx_widget_contacts][/vc_column_inner][vc_column_inner width="1/2" column_align="right" icons_position="left"][trx_widget_socials align="right"][/vc_column_inner][/vc_row_inner][/trx_sc_content][/vc_column][/vc_row][vc_row full_width="stretch_row" row_type="compact" row_delimiter="" row_fixed="" hide_on_mobile="" hide_on_frontpage="" css=".vc_custom_1493286847320{background-color: #171a1d !important;}"][vc_column column_align="center" icons_position="left"][trx_sc_content size="1_1" float="center" number_position="br" title_style="default" padding="none"][vc_wp_text]

Felipe Kakimoto 2024. Todos os Direitos reservados. Desenvolvido por Clipper & Oceano Digital.

[/vc_wp_text][/trx_sc_content][/vc_column][/vc_row]